Sunday, January 25, 2009

Murmúrios de mar

Estrela estava sentada na varanda. Banhava-se no sol, sentia o vento roçando em si; mergulhada nos seus pensamentos. Algo a inquietava por dentro. Voltava a ter esta sensação de... não sabia explicar de quê. Sabia, porém, o que provocava nela este sentimento.
Muitos meses tinham passado desde aquele encontro na rua, a última vez que o vira. Aquele fugaz momento, em que despejara a sua alma, por palavras, gestos, olhares, sem receio nem pudor... Sim, muitos meses tinham passado; a vida ocupava-se de outras matérias, esforçadamente.
Mas então porquê...?, porque voltava agora este sentimento? Porque não conseguia Estrela deixar isto tudo para trás, de uma vez por todas? Era como se ele a chamasse, gritasse o seu nome desesperadamente, implorando para ser ouvido, do outro lado do mundo...! Não, isto não podia estar a acontecer, novamente esta loucura!
Estrela respirou fundo e olhou o mar, espreitando ao longe, por entre as casas. Estava calmo, sereno, cantando suavemente, uma música que só Estrela conseguia ouvir. Mas ela não conseguia afastar aquela inquietude. Era como se algo importante estivesse para acontecer. O som suave, distante das ondas não a acalmavam, pelo contrário! Estrela sentia-se mais e mais ansiosa, sem perceber porquê. Sentia o estômago às voltas, um nó na garganta, as suas mãos suavam, a respiração mais rápida, o coração acelerado... O coração... O coração doía-lhe...
Levantou-se, encostou-se ao parapeito da varanda. Inesperadamente, o vento ficou mais forte, soprou-lhe intensamente os cabelos, que dançaram ao seu sabor; o sol brilhou mais e tornou-se mais quente; o mar cantou mais alto. Olhou para o lado e reparou que estava uma carta no parapeito. Uma carta que lhe parecia familiar, sem nunca a ter visto. Quase podia sentir o seu cheiro, jurar que brilhava e que a chamava, como as cartas guardadas na sua gaveta.
A sua visão ficou turva, lágrimas aprisionadas nos seus olhos. Estendeu a mão e tocou no envelope.
És tu quem procuro quando perscruto a noite. Uma voz, a voz tão querida, sussurrava-lhe ao ouvido, como carícia... Estrela chamou-o, num suspiro...
A carta tinha desaparecido. O vento acalmou; o sol empalideceu; o mar tornou-se distante, de novo. Ficou-lhe apenas a mesma inquietude, a mesma dor, a mesma solidão... A mesma saudade...
Sentiu de novo o último beijo, o último olhar... O mar ao longe... Murmúrios de mar... Gritando saudade...
Murmúrios de mar...