Wednesday, November 08, 2006

Sem Título

- Senta-te.
O mar sussurrava ao de leve naquele fim de tarde. O sol estava-se deitando, sonolento, e as pessoas começavam a sair da praia. Ele sentou-se ao lado dela, olhando-a atentamente.
- Está uma tarde linda, não está?
- Sim, bastante agradável. - não sabia o que havia de responder.
Ela fitava tranquilamente o mar, como se procurasse algo por entre as ondas.
- Porque vieste? - perguntou.
- Porque me pediste. - não conseguiu encontrar melhor resposta.
- Podias não ter vindo. Sabes que não me ia importar.
Ele encolheu os ombros.
- Porque vieste? - voltou a perguntar.
- Eu preocupo-me contigo, Estrela!
- Estrela... Pergunto-me porque será que me puseram esse nome...
Não tirava os olhos de mel do mar. Ainda não tinha olhado para ele desde que chegara e se sentara na areia com ela.
- Porque és linda e brilhas, como uma estrela! - foi a única coisa que conseguiu arranjar para dizer. Não sabia porque ficava sem palavras sempre ela lhe falava assim.
Estrela enfrentou-o.
- Sou linda aos teus olhos? - o brilho dos olhos dela entrava por ele adentro, causando-lhe uma ligeira tontura.
- És linda aos olhos e ao coração. - respondeu, tentando aguentar a intensidade que emanava das pupilas dela.
Ela desviou o olhar, - o que foi um alívio para ele-, sorrindo tristemente.
- Mas o meu brilho não é suficiente. - fitou de novo o mar, e o sol como um disco cor-de-laranja.
-Desculpa, mas não te posso...
- Shh...! Ouve o mar... As ondas rebentando suavemente. Parecem fogo líquido com o sol a pôr-se.
Ele olhou e ouviu. estava como todos os dias.
- Porque é que tens que procurar significados no que é apenas água e sol?
- Para poder dar sentido a mim própria.
- Mas tu tens sentido!
- Não sem... - deteve-se, a voz parecia vacilar, os olhos ganhando um brilho aquoso - Nã0, não tenho.
Ele enfiou a cabeça entre os joelhos. Não sabia o que pensar. Era a última pessoa que queria ver sofrer e a primeira que tinha atingido. Recusou-se a olhar para ela quando ela disse:
- Queria ser como ele. Beijar a areia, aquecer-me ao sol, murmurar palavras de maresia. Ondular e desfazer-me em espuma salgada na costa.
Ficou algum tempo de cabeça entre os joelhos, num turbilhão de pensamentos sem nexo, as palavras dela ecoando na sua cabeça.
Quando finalmente a levantou, Estrela estava à beira-mar, despindo o vestido, que esvoaçou ao vento. A sua perfeita silhueta recortava-se contra o sol crepuscular, os cabelos ondulantes dançando no ar, qual algas flutuando em água salgada. Já não se via ninguém na praia para além deles os dois.
Ele levantou-se e aproximou-se dela. O vento trazia-lhe o seu cheiro doce, ambígua mistura de mel e jasmim, um tanto ou quanto perturbador.
Observou cada traço. Percebeu que não tinha mais nada a fazer ali. Virou-se e foi embora, ouvindo o mergulho longínquo de uma estrela no mar.

Saturday, November 04, 2006

Tributo ao Inverno

Ouvem-se os pingos da chuva, do lado de lá da janela, alguém foge deles, como quem foge da purga. Nestes dias tristonhos em que o dia é como a noite. Não deixa o sol passar as nuvens, espessas e choronas.
É frio estar sem ti, Inverno, que és ainda assim frio, mas mais quente que o nada. Mais ainda, a terra molhada, com o seu cheiro único, simples, cheiro de terra molhada.
Tem tudo isto algo de sagrado e superior, quanto mais não seja por ser natural, tão natural que estranha. Espanta. Deslumbra.
Oh! Inverno... Tão belo, branco ou cinzento, nunca preto, pois preto é o nada e tu és mais quente que o nada, E, ainda assim, frio.
Vem a mim, frieza molhada, que me aqueces dizendo que tudo é um ciclo: não começa, não acaba, não vive nem morre, apenas é. E não vivendo nem morrendo, cria vida e floresce morte.
Ama o Mundo, criação genuína e suprema, que és tu mesmo, Homem, alma e carne. E sente cada gota de chuva tocar a tua face, singular nota de uma música, cinzenta ou branca, bela e quente.

Friday, November 03, 2006

O leve calor da tua respiração como uma doce brisa roçando o meu rosto. trémulos sons de suave cor-de-rosa dançando entre nós, algo lindo...! Ah... É tão bom estar assim contigo, sentir que estás aí, quente, ao meu lado. E ouvir o silêncio cantando timidamente, baixinho, melodias de todo o tempo.
Olhar os teus olhos é mergulhar num oceano de sentimentos, turbilhando, ardentes, afastando a espuma das ondas, deixando ver o fundo aquoso, uma arca de um tesouro tão belo que ofusca. Tão belo como não há.
Pequenos toques são como mil beijos, sussurando palavras que não se ouvem, apenas se sentem. Proteges-me, oh! meu doce casulo, não me deixes cair... sou tua.
Ninguém me acorde deste sonho, me arranque o mais lindo que encontrei e tenho. Ninguém. Quero ficar acolhida nos teus braços de anjo. E sentir a chuva purificar o meu ser. Velas luzindo, inseguras se ardem ou apagam. E pedindo que me olhes, me vejas, me sintas, me cheires... me ames. Assim como eu te olho, vejo, sinto, cheiro e amo.
Porque, se observar mais atentamente, reparo que tu não estás lá. O lindo não há. O amor perdeu-se. O vazio domina. E eu sempre estive sozinha.